O governo federal tem a obrigação de fazer a economia crescer. A opinião é de Marcos Freitas Pereira, sócio-fundador do WAM Group, empresa do ramo de turismo imobiliário, em entrevista exclusiva na série UOL Líderes. “Queremos do governo que nos dê tranquilidade, estabilidade política e econômica.”
A WAM surgiu em 2013, em Goiás, após a união de três sócios investidores decididos a desenvolver a multipropriedade no ramo do turismo brasileiro. A modalidade de propriedade compartilhada permite ao consumidor comprar uma fração de empreendimentos imobiliários, como um quarto em um hotel no seu destino preferido, para utilizar nas férias por até duas semanas por ano.
A empresa hoje é a maior do ramo fora dos EUA. Opera 27 empreendimentos hoteleiros, incluindo três parques aquáticos e mais de 5.000 apartamentos em 14 destinos turísticos. O grupo consolidou investimento de R$ 2 bilhões no último ano e planeja aplicar mais R$ 4 bilhões em novos empreendimentos, incluindo unidade em Orlando (EUA).
▶️ Qual sua expectativa para a economia no próximo ano, quando haverá eleições?
Temos que ter decisões desse governo que façam a economia crescer em 2022. Em 2021 vai crescer porque a base de comparação é com 2020 [que teve queda]. Por inércia já cresceria. O importante é olhar o ambiente de 2022.
Não nos interessa se é um ambiente de eleição. Alguma coisa tem que ser feita. É obrigação desse governo fazer com que a economia cresça. É expectativa empresarial que a economia cresça acima [de 2021]. No começo deste ano, a gente falava de 2,5% [de alta] para 2022, quase 3%. Já estamos com previsão abaixo de 1%. Para ficar zero ou negativo, é num piscar de olhos. Realmente a gente torce para que esse governo faça alguma coisa.
▶️ A tensão política impacta o ambiente de negócios?
Estamos vivendo um momento econômico e político não muito favorável empresarialmente. O que o empresário quer é previsibilidade e segurança jurídica. Toda vez que tem essa crise política e econômica, [o cenário] atrapalha muito os negócios. Queremos do governo que nos dê tranquilidade, estabilidade política e econômica.
▶️ Acredita que as reformas da equipe econômica vão andar?
As reformas são importantes, mas elas têm que ser amplas. Elas têm sido muito meia-boca. As reformas [tributária e administrativa] têm que ser completas para serem mais duradouras, senão daqui a dois anos discutiremos de novo.
▶️ O que é multipropriedade?
Marcos Freitas Pereira – Ela tem a sua origem na Europa, EUA e México. Está inserida numa consolidação da economia compartilhada, que advém das crises do sistema capitalista.
A grande produção de ativos acaba gerando uma crise de oferta. Aproveitamos ativos ociosos para dar um destino melhor a eles.
A multipropriedade turística é a adaptação desse contexto. Não precisa mais cada um ter o seu carro -temos Uber à disposição, temos uma série de ofertas de bens e serviços compartilhados. É nesse contexto que nasceu a WAM, voltada para o segmento de turismo.
▶️ Como funciona na prática?
A multipropriedade é para aqueles clientes que não têm condições de ter uma segunda moradia. Fizemos uma pesquisa em 2007 que mostrou que apenas 15% do público flutuante [de Caldas Novas/GO] tinha renda para comprar um apartamento que custava mensalmente de R$ 1.500 a R$ 1.800. E 65% que visitavam a cidade não tinham condições, mas tinham uma renda entre R$ 6.000 e R$ 10 mil e poderiam comprar um bem de um valor menor.
Pegamos um apartamento, dividimos, e cada usuário tinha direito a cinco semanas por ano. Depois, a gente foi aprendendo, e hoje nós vendemos uma ou duas semanas por ano. [O valor da cota de um imóvel de multipropriedadale da WAM varia de R$ 40 mil a R$ 80 mil.]
Quando nós ofertamos isso para Caldas Novas, em 2008 e 2009, a gente percebeu que o tiro foi certeiro, porque as pessoas, além de comprarem a ideia, de terem oportunidade de ter a sua segunda moradia, de a prestação caber no bolso, ainda tinham o direito real, tinham a propriedade, a escritura. Acabamos democratizando o turismo e o lazer.
▶️ Podemos chamar a multipropriedade de ‘turismo imobiliário’?
Existe esse conceito. É aquele ramo imobiliário que está voltado para a segunda moradia e destino turístico. Em Portugal, é muito forte esse conceito de turismo imobiliário.
O conceito é novo, mas a prática é extremamente antiga. Onde há destino turístico sempre houve venda imobiliária.
Eu sou paulistano, vimos muito isso nas praias na minha juventude, no litoral sul, litoral norte. Era um desejo de consumo ter uma casa na praia, e na época a gente não tinha condições.
Se houvesse compartilhamento, com certeza meu pai teria comprado na minha adolescência um contrato de multipropriedade.
▶️ Qual o perfil de quem investe num imóvel para usar apenas duas semanas no ano?
O nosso cliente familiar: marido, esposa, dois ou três filhos. Eles viajam sempre em família, a renda é a que cabe a prestação, hoje está em torno de R$ 6.000 a R$ 10 mil. Temos produtos mais caros também, produtos de luxo, mas o target mesmo são aqueles 65% que descobrimos nos destinos turísticos, que não tinham condições de comprar uma segunda moradia.
▶️ Como a pandemia impactou o mercado?
Nós vimos as famílias se sentirem isoladas em apartamentos e casas menores. A gente percebeu uma demanda grande por casas maiores, pessoas trocando apartamentos por casas, buscando casas no interior, uma segunda moradia. Estamos percebendo isso também na multipropriedade.
▶️ Como foi o impacto na WAM?
A pandemia para nós foi muito difícil, tivemos que olhar para dentro do nosso conjunto de empresas e fazer o dever de casa para preparar a retomada. Hoje temos um crescimento em torno de 70% de venda em relação a 2019, pré-pandemia.
Temos sido procurados por algumas incorporadoras do Brasil para pensar em fazer alguma coisa com o conceito de multipropriedade nas cidades. A cidade de São Paulo pode ser uma cidade turística, porque muita gente vai para fazer compras, tratamento médico, passear. Então, existe essa possibilidade, e já temos alguns projetos em estudo para fazer isso [em São Paulo].
▶️ Qual o potencial de crescimento da propriedade compartilhada?
Eu acredito que teremos um boom imobiliário muito grande pós-pandemia, e já estamos percebendo isso. Os números já estão mostrando isso para nós, tanto no segmento residencial, para a primeira moradia, e muito mais ainda no segmento de turismo.
▶️ A perspectiva de crescimento será com novos investimentos?
Vamos investir em novos projetos e compra de hotéis para reformar e transformar em multipropriedades. Temos um valor até razoável que captamos por meio de fundos imobiliários, estamos preparados para fazer esse investimento.
Lançamos neste ano, em novos projetos, R$ 2 bilhões. Estão previstos, já contratados para lançarmos em 2022, R$ 4 bilhões em novos projetos. São números grandes e que você não tem referência no mercado.
▶️ Retrofit como o do Hotel Nacional, no Rio, é tendência?
Temos um projeto através do nosso fundo imobiliário para compra de hotéis, que já estamos negociando e adquirindo. Alguns já estão fechados, outros ainda em conversas.
Mas eu diria que desse dinheiro [R$ 4 bilhões] cerca de 60% serão utilizados para compra de hotéis, e o objetivo é reformar e vender no formato de multipropriedade.
Fizemos isso com um ícone, que é o Hotel Nacional do Rio de Janeiro. Nós compramos o Hotel Nacional, que tem sido um sucesso absoluto de vendas. [UOL]